Na manhã desta quinta-feira (2), o diretor-presidente do Departamento Estadual de Trânsito (Detran-ES), o delegado Fabiano Contarato, criticou a legislação de trânsito brasileira e a falta de fiscalização e educação para esta área, durante audiência pública “Violência no trânsito e suas consequências para a população brasileira” na Câmara dos Deputados, em Brasília. O deputado federal Sergio Vidigal (PDT-ES), proponente da audiência, presidiu toda a sessão.
Os dados de acidentes com vítimas fatais no trânsito foram os principais motivadores da audiência. “O significado de acidente é imprevisto, e hoje, infelizmente, a maioria dos acidentes não são imprevistos, são causados pelo homem. Grandes são os transtornos causados pelos acidentes de trânsito, que implicam na incapacidade da força de trabalho da população, em muitos casos na fase mais produtiva de sua vida”, explica o deputado Sergio Vidigal.
Dados do Ministério da Saúde apontam que em 2014 foram 201 mil feridos hospitalizados e o seguro DPVAT em 2014, concedeu 52.200 indenizações por morte e 596 mil por invalidez. Por ano, o trânsito mata 60 mil pessoas.
Na abertura da fala, Contarato fez uma chamada citando nomes de vítimas de trânsito no Espírito Santo. Durante sua explanação, em meio a críticas à legislação brasileira, ele sugeriu a elaboração de uma lei que amplie o alcance da Resolução 432 do CONTRAN, objetivando estender a obrigatoriedade do exame não só de alcoolemia, mas também o exame toxicológico para todas as vítimas de acidente de trânsito sejam elas fatais ou não. “Essa medida será um ganho para todos os motoristas, já que a prova será preservada, permitindo uma apuração mais justa nos crimes de trânsito. Precisamos buscar a verdade real em todos os incidentes de trânsito”, comentou o delegado.
Outra sugestão apresentada por ele visa humanizar o atendimento às famílias vítimas de acidentes de trânsito. “Deveria ter uma comissão de psicólogo, psiquiatra para oferecer um atendimento psicossocial às famílias vítimas de acidentes de trânsito, a fim de evitar o total desmantelamento das famílias.”
O diretor do Detran-ES chamou a atenção sobre a necessidade de estabelecer a mesma redação dos parágrafos 1º e 2º do art. 308 para o art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), que foram incluídos pela lei 12.971/14, bem como revogar o parágrafo 2º do art. 302 do CTB que trata especificamente de homicídio culposo no trânsito proveniente de embriaguez ou disputa de racha.
“A alteração da lei se faz necessária, haja vista a sua incoerência, pois aplica dois pesos e duas medidas para a uma mesma questão: rachas que resultem em morte e cuja reclusão, segundo o artigo 302 parágrafo 2º do CTB, varia de dois a quatro anos, enquanto que o art. 308, da mesma lei, indica uma penalidade maior, de cinco a 10 anos. Isso abre brechas para diferentes interpretações acerca da lei e pode acabar beneficiando infratores”, comentou.
O delegado criticou a ineficiência da lei. “Um motorista flagrado bêbado recebe de volta, em cinco dias, a CNH. E ainda tem seis instâncias para recorrer dessa penalidade. O CTB garante impunidade no país. Ele estabelece 11 crimes e nenhum deles prevê cadeia. Deveria acontecer como na Lei Maria da Penha em que não se pode haver substituição de pena.”
Ao final de sua exposição, Contarato, emocionado, pediu perdão. “Eu quero pedir perdão, se é que tenho legitimidade para isso, em nome do poder público, por ser ineficiente na fiscalização. Perdão por ser ineficiente na educação e legislar, infelizmente, não em defesa da vida”, desabafou.
A Coordenadora Substituta da Coordenação-Geral de Qualificação do Fator Humano no Trânsito do Conselho Nacional de Trânsito, Rita de Cássia Ferreira da Cunha apresentou os dados recentes do trânsito brasileiro. Segundo ela, o Brasil possui, hoje, mais de 87 milhões de veículos e 59 milhões de condutores habilitados. Com esses números, o país registra cerca de 42 mil óbitos no trânsito a cada ano. Rita aproveitou para criticar os baixos valores destinados aos órgãos para atuar na educação e segurança de trânsito. “Mais da metade do que é arrecadado é contigenciado pelo governo federal e somente 15 milhões, que foi destinado pelo orçamento para este ano não nos permite fazer muita coisa”, desabafou.
Também participou da audiência, o diretor do Departamento de Medicina de Tráfego Ocupacional da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (ABRAMET), Dirceu Rodrigues Alves Junior e apresentou dados alarmantes. Segundo ele, 93% dos acidentes são causados pelos próprios motoristas. “Os outros 7% são ocasionados por falas no piso, de sinalização. Mas tudo isso é falha humana. O homem é o único agente causador. Não foi Deus quem quis que os acidentes acontecessem”, explanou.
Junior mostrou que o Brasil é o terceiro país do mundo em números de óbitos de trânsito, ficando atrás de Índia e China, chegando a 25 óbitos a cada 100 mil habitantes e resultando em 560 mil incapacitados ou lesionados. Por dia, no país, são mais de 1.576 mutilações.
Para ele, o CTB “é o melhor do mundo, só precisa ser colocado em execução.” O diretor da Abramet defende
penas mais duras para o motorista infrator. “As vítimas do trânsito estão entre 18 e 34 anos. Assim o país perde mão de obra e até mesmo arrecadação. Não podemos permitir que o condutor veja tv e uma série de outras coisas que o tirem a atenção. Temos que ter multa como as da lei seca, que influenciam na vida do motorista e mechem no bolso do condutor”, defendeu.
Outras sugestões apresentadas por Junior tratam de uma redução do período em que o condutor seja reavaliado pelo Detran, instituir a educação do trânsito no sistema de educação brasileiro, assim como melhorar o curso de formação de condutores. “Tirei minha CNH em 1972 e nunca mais fui chamado para reciclagem. Isso porque eu não aprendi a dirigir, mas a fazer o carro andar. Não aprendemos a conviver com as adversidades do dia a dia.”
O deputado federal Jorge Silva (Pros-ES) foi um dos parlamentares que participou da audiência pública. Ele afirmou que vivemos uma epidemia de morte no trânsito, “uma verdadeira guerra civil”.
Saiba mais:
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Em 2014, foram concedidas mais de 52 mil indenizações por morte no trânsito no país.
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Por ano, o trânsito faz mais de 60 mil vítimas fatais.
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Neste mesmo ano, outras 590 mil foram para invalidez permanente.
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No último ano, o Brasil gastou mais de R$ 40 bilhões em despesas hospitalares, dano ao patrimônio e previdência para atender às vítimas de trânsito.
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Cerca de 70% da ocupação de alas pediátricas e traumáticas de hospitais são vítimas de acidentes de trânsito.
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52% das vítimas de acidentes de trânsito possuem entre 18 e 34 anos.